quinta-feira, 27 de abril de 2017

Nem tão elementar, meu caro Watson

Tomislav R. Femenick – Da Academia Brasileira de Ciências Contábeis
Nos Laudos Periciais os fatores subjetivos são identificados como aqueles que são norteados pela experiência, expertise e competência do perito e que, portanto, expressam um juízo de valor. Sabendo-se que pessoas diferentes podem tirar conclusões diferentes de uma mesma questão e ambas estarem corretas, o campo dos fatores subjetivos nas Pericias Judiciais é amplo e reconhecidamente necessário. Todavia há que se ter parcimônia no uso e influência de fatores subjetivos na estruturação de Laudos Periciais, bem como na interpretação de dados que sejam factíveis de subjetividade. Porém os elementos objetivos não podem ser objetos de interpretação e de “achismo”. 
Um dos princípios base do raciocínio científico diz que o “todo” se decompõe em “partes” e que a junção de todas as partes recompõe o todo. Outro axioma do mesmo campo impõe que, em um conjunto de variáveis, todas têm que ser verdadeiras para que o resultado da equação seja igualmente verdadeiro. É uma situação similar ao silogismo, sistema de raciocínio dedutivo, que parte de algumas premissas para se obter uma conclusão lógica. Para que a conclusão seja verdadeira, todas as premissas também têm que ser verdadeiras. “Elementar, meu caro Watson”, diria Sherlock Holmes. Proposições elementares, mas nem sempre seguidas com acuidade. 
Todavia nem sempre é assim tão elementar. Vejamos um caso concreto. Recentemente fomos convidados a analisar uma Perícia Contábil de um processo judicial em que se avaliava uma empresa para fins de dissolução da sociedade. Aparentemente nada de anormal. No entanto, ao estudar a metodologia adotada pelo perito e, ainda, como essa metodologia foi usada, nos deparamos com algumas impropriedades. Primeiro, o Laudo Pericial tinha sido estruturado tendo como base o sistema de Fluxo de Caixa Descontado, metodologia fundamentada nos seguintes pressupostos: a) o valor do empreendimento está relacionado à expectativa de geração de caixa em períodos futuros; b) a capacidade do negócio gerar recursos financeiros lhes confere valor. Essa lógica é correta quando a sociedade continua existindo, mesmo com a saída de alguns sócios, e não com a saída de todos os sócios. Havia ainda um agravante, era uma sociedade mista de capital e pessoas, pois a geração de caixa estava intimamente ligada ao trabalho dos sócios; profissionais liberais de um mesmo ramo e de uma mesma especialidade.
Mais estranho ainda foi o fato de que as “fórmulas matemáticas utilizadas eram indicadas somente para sociedades anônimas de capital aberto”, com ações negociadas em bolsa de valores. Uma das fórmulas usada inclui elementos bem próprios para esse tipo de empresas: “beta desalavancado”, “variações do valor das ações” em dado período, “risco país” atribuído por empresas de rating, tais como a Moody´s e Standard & Poor´s etc. Em outras palavras: o perito não teve a acuidade de adapta-las à realidade objetiva: o capital das sociedades limitadas é formado por quotas inegociáveis com terceiros – a não ser em casos específicos, previstos em Lei.
Voltemos à quentão inicial. Se uma das partes do todo é imprópria, inadequada e/ou não correta, o tudo fica descaracterizado e perde a sua significância. 

Tribuna do Norte. Natal, 20 abr. 2017. 
 




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