sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Sr. Cláudio "Claver" foi embora para a capital.

Ele foi embora para João Pessoa, depois de vender seus bens em Bananeiras. Ficou no Nordeste. Não quer viajar para o antigo "sul maravilha", apelido dos anos sessenta, hoje região de muita violência. Pois é, cheguei na Chã do Lindolfo, e perguntei pelo pedreiro Cláudio. "Se mudou para a capital", disseram-me. No ano passado, conversei com ele num boteco da beira da estrada PB-105, que parece a superfície da Lua. Leiam a matéria republicada.

Luiz Gonzaga Cortez.

A sabedoria popular rural, matuta, é muito mais  abrangente, humana, esperta e real do que a sabedoria do homem urbano, seja lá onde for. O homem dos grandes centros urbanos, das capitais e/ou das médias cidades, hoje dominadas por vícios e desvios de conduta de diversos matizes, é individualista, egoísta, enrrolão e exibicionista. Certa ou errada, esta é a minha opinião. O matuto é um homem simples. Você duvida? O matuto vê a coisa errada, observa um pouco mais, analisa e opina, tenha ou não tomada uma lapada de cana. Matuto é desconfiado também. Algumas categorias de trabalhadores da zona rural (pedreiros, por exemplo) não acreditam muito na capacidade de trabalho do jovem trabalhador urbano, daquele jovem que vem da sede da pequena ou média cidade do interior para trabalhar numa construção na zona rural. Mas isso merece uma pesquisa sociológica aprofundada, em virtude do consumo de drogas ilícitas está desenfreado, “sem currutelo” no interior do Nordeste. A tendência é o tráfico aumentar porque os governadores não estão nem aí...
È bom conversar com o homem do interior do Rio Grande do Norte e da Paraíba, dois estados irmãos e vizinhos. Vamos começar por Bananeiras, região do brejo paraibano, onde pesquiso a dança “Lesô”, praticada desde 1822, na localidade chamada de “Gruta de Antonia Luzia”, a uns quatro quilômetros da sede daquela cidade. Num boteco de beira da estrada que liga Bananeiras a Chã do Lindolfo, conheci Francisco Claver da Silva, um matuto de 64 anos, homem vermelhão, ex-pedreiro que se aposentou por causa de uma queda de motocicleta. Foi o primeiro homem que conheci e que dançou o “Lesô” na juventude. “Dancei e muito o lesô, no tempo que era bom e não havia essa violência de hoje. Era uma brincadeira boa e limpa, sem confusão. Mas os tempos mudaram e a gente não pode brincar. A violência aumentou e a vida mudou, né não? Bom, naquele tempo não havia revólver por aqui. Só faca. Hoje, meu filho, a coisa está feia, é arma como os seiscentos diabos. A violência de hoje, a violência dos meninos por aí, é tudo por causa da inveja, o outro que tomar na marra o que o outro tem. Eu posso ir a uma festa e não voltar com vida ou perder a minha moto. No fundo de tudo isso é inveja mesmo, pode ir atrás pra saber. Tomar as coisas sem fazer esforço. Isso é obra da natureza de cada um. Eu rogo e peço a Jesus  felicidades e se livrar dessas passagens”, disse Francisco Claver da Silva, conhecido por “Cláudio”. Já mataram alguém num lesô? “Não, nunca houve morte”, respondeu e ficou calado. Cá comigo, ele está escabriado, cabreiro, por isso, não quer opinar,
Eu perguntei se ele era de uma antiga família rica, os Claver Grilo. “Não, meu pai era amigo e compadre de “seu” Claver e botou esse nome no meu”, respondeu o filho de José Eneas da Silva e Maria Augusta do Nascimento. E o “Barão de Araruna? “Nunca ouvi falar”. È verdade, o povo de Bananeiras também não sabe quem foi o conterrâneo que recebeu o título de Barão no tempo do Império.
Francisco Claver da Silva e dona Maria da Silva, ambas sexagenárias, dona do bar “Sabor Real”, especializada em mocotó e picado, foram duas pessoas que ouvi sobre o “lesô”, uma dança que não consta de nenhum dicionário de folclore brasileiro. Mas isso é outra história.
Luiz Gonzaga Cortez, jornalista e pesquisador.
Francisco Claver da Silva – o homem da sabedoria matuta. Foto de L.G. Cortez – 01.11.2010.


Ele foi para a capital, mas já esteve na Chã do Lindolfo revendo o panorama, a beleza natural do pedaço de terra que deixou na zona rural de Bananeiras. Vendeu a motocicleta. Agora já pode tomar umas e outras e voltar para casa em segurança.




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